domingo, 17 de janeiro de 2010

Sobre o Haiti, a Sandy, o Caetano e os Titãs

Época verdadeiramente relevante passa a humanidade.

Quantas milhares de pessoas deixaram seus carros físicos, deitados ao solo pela violência decorrente dos movimentos sempre inquietantes da Terra. Habitando em lares de parca estrutura, num local de conhecida miséria, não puderam resistir aos atritos de placas tectônicas, que jogaram ao solo massas enormes de blocos, cimento e areia. Aos que permaneceram, restou o agravamento da fome, da sede, de todas as necessidades básicas. Sem lar, sem provisões, sem esperança.

E eis que o mundo começa a se mover. Milhões de dólares são depositados sobre aquele país, na forma de víveres e de pecúnia. Vêm de gente conhecida – atores, atrizes, modelos, esportistas. Pessoas que sempre acumularam muito dinheiro, em virtude de sua fama e beleza, e que se condoeram pela desgraça natural. Antigos inimigos políticos, ex-presidentes, se unem num fundo comum, que leva seus nomes, a fim de colaborar de alguma forma. A União das Nações levanta fundos extraordinários. Enfim, é um momento também de beleza para a humanidade. Nós, que sempre nos destruímos, estamos nos movendo para ajudar braços anônimos, que se unem numa massa negra e informe, a clamar pelo simples direito de continuar vivendo, ainda que com sua vida destroçada.

Tudo isso é muito belo. Mas que teria feito essa ajuda se tivesse chegado antes? Quantas pessoas precisam morrer para que nosso coração se deixe tocar pela dor do outro? O tal país vive em imensa miséria, não por causa do abalo de forças sísmicas. Assim ele está desde que criado foi, sendo sustentado por tiranos que extraem imoderamente os bens dos mais pobres em nome de uma luxuosa riqueza, e de um poder que causa sentimentos tais como a “vergonha alheia”.

Quantos braços dessa massa negra já haviam perecido, não apenas por doenças as mais diversas. Por fome. Por miséria. Por uma violência injustificada, causada pelo próprio homem contra si mesmo. Não precisamos de mãe natureza para que venha nos destruir. Aliás, ela só cumpre sua função, que é nos manter vivos. É preciso esse movimento para que seis bilhões continuem sobrevivendo nessa nave.

Mas aqueles milhares nem precisavam ter morrido. O desenvolvimento das tecnologias e do conhecimento da humanidade tornam o fenômeno, se não imprevisível, passível de ser esperado. Que teria acontecido àquela massa com prédios firmes, preparados para tais movimentos?

Afinal, a quantas tragédias ainda teremos de assistir? Vamos ao cinema assistir a um filme, e nos decepcionamos quando são poucas as cenas de morte. Quantos ainda? Quanto tempo ainda até que aprendamos a amar a nossos irmãos de humanidade, sejam eles de onde forem?

Aquele país voltará a caminhar, com toda sua miséria. Daqui três semanas, este relato estará datado. As pessoas nem se lembrarão mais desse fato. E a miséria continuará existindo no Haiti. E no Brasil. Os meninos continuarão sob as marquises, roubando e matando, porque assim lhes foi ensinado na favela, que tememos. Os artistas, esportistas, políticos, continuarão somando contas inacreditáveis de dinheiro, porque assim é que funciona o mundo. E ninguém se lembrará de direcionar um único centavo àquela gente miserável, que merece viver com dignidade, pelo simples fato de serem humanos?

E no nosso trabalho, continuaremos nos encontrando com pessoas que são diferentes da gente, que brigam conosco e nos perseguem pelos mais diferentes motivos. Miseráveis morais, a quem não saberemos direcionar uma única migalha de desculpa? E continuaremos distantes de nossos familiares e amigos, vivendo para nós, pensando em comprar mais e morar num lugar melhor, na triste ilusão de que isso nos fará mais felizes?

O Haiti é mesmo aqui, em todo lugar. Miséria, em qualquer canto. E nós continuaremos indiferentes?

Um comentário:

Luciana disse...

Realmente somos ainda moralmente miseráveis.Olhamos apenas o nosso umbigo.Poucos arregassam as mangas pra agirem de coração antes que aconteça o pior,antes que a fome venha... enquanto outros, vão se dar conta apenas quando o fato já ocorrido,daí aparecem para dizer que fazem algo pela sociedade e depois somem!E no dia-a-dia?
... não sabemos como será o nosso dia de amanhã,quem sabe se não seremos nós que estaremos precisando de ajuda ou será que já não estamos? Será que não passamos por uma vivência de dores físicas ou morais? Será que tem algum coração bom nos auxiliando? E nós? Estamos também auxiliando de coração ou por obrigação, imagem?

Sei que o tempo vai passando nesta nossa existência, como as oportunidades que vamos perdendo de sermos úteis, tendo a alegria de poder servir, de nos colocarmos a disposição do outro,reajustarmos com o próximo... e o quê a nossa consciência nos diz? É claro que cada um saberá avaliar a sua, uns pelo materialismo,egoísmo,orgulho, vaidade... outros já com o despertar do desejo sincero de auxiliar,uma postura cristã e ação no bem, mesmo que sendo em pequenos gestos do dia- a- dia. Será que estamos fazendo a nossa a parte? Posso auxiliar de alguma forma aqueles que são os meus familiares,amigos, vizinhos, a minha comunidade, todos ao meu redor?
Será que não são as nossas próprias vibrações em desarmonia que refletem no Mundo e acabam transmitindo por essas tempestades de dores físicas e morais?


Bjs
TAMM
Lu.